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23 Abr 2024

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Opinião

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Edite Estrela

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09.01.2017

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Sempre à frente do seu tempo

O PS está de luto. Luto carregado de tristeza profunda. Morreu Mário Soares. Como é doloroso escrever estas palavras.

 

Precisamente um mês depois de completar 92 anos, talvez porque “viver sempre também cansa”, num sábado soalheiro, partiu o fundador e primeiro Secretário-geral do PS. Com a morte do “pai da democracia”, não apenas os socialistas, mas todos os democratas, sentem uma dolorosa orfandade. Portugal perdeu a figura maior da sua história contemporânea, o símbolo e a memória viva da oposição à ditadura e da conquista da democracia.

Júlio Pomar escreveu que a vida é um dicionário em movimento. A vida pessoal e política de Mário Soares não cabe nas páginas do Morais ou do Houaiss, obriga a reinventar as palavras a que outros tiraram o brilho. A sua vida é história viva e colorida, é debate de ideias e combate por ideais, é coragem física, política e moral. É determinação e luta por convicções, princípios e valores. É exemplo para os mais novos.

Mário Soares esteve sempre presente nos grandes momentos do Portugal democrático. Ele foi o visionário que integrou Portugal nas Comunidades Europeias e teve a “Europa connosco”. Que na Fonte Luminosa defendeu a liberdade e a democracia. Que anteviu os riscos da globalização desregulada e o desastre da “economia de casino” e do “caminho único”. Que defendeu “o direito à indignação mesmo antes de existirem indignados”. Que esteve sempre à frente do seu tempo.

Há recordações que guardarei para sempre. A minha admiração incondicional pelo Presidente Soares remonta a 1989, quando tive o privilégio de representar o PS na visita de Estado à Holanda e à Hungria. Pouco tempo antes da partida, soube-se que o João tinha sofrido o acidente na Jamba. Com o filho entre a vida e a morte, julguei que o Presidente cancelasse a viagem. Percebi então que ser presidente da República impõe deveres que o comum dos mortais não aceitaria. Deduzi que há funções que limitam a liberdade pessoal de quem as exerce. E compreendi que há qualidades que uns têm e outros não. Só um grande estadista, em tais circunstâncias, colocaria acima da tragédia familiar a representação externa do Estado português.

Na prisão da ditadura, aos vinte anos, conta Pomar que, entre os jogos e brincadeiras com que iludiam o tempo, se punham a adivinhar o futuro de cada um e alguém vaticinou “tu, Mário, vais ser presidente da República”. Ao que ele retorquiu, voltado para Pomar, “e tu vais ser um grande pintor”. Acertaram. E como sempre aconteceu nos cargos que desempenhou, também na Presidência da República, Mário Soares deixou a sua impressão digital. Transformou, inovou, modernizou. Levou a Presidência a todo o país e aproximou as pessoas de Belém.

Obrigada, Mário Soares, por nos ter dado tudo o que é importante.

 

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Edite Estrela

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09.01.2017

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EDIÇÃO Nº1418
Janeiro 2024